Essa condição, com exceção dos pacientes diabéticos, é uma condição incomum e deve ser suspeitada quando a glicemia for menor que 60 mg/dL. Valores de glicemia inferiores à cerca de 55 mg/dL produzem uma resposta fisiológica reflexa com a secreção de catecolaminas, surgindo então os chamados sintomas adrenérgicos. Valores ainda mais baixos de glicemia irão comprometer as células nervosas, dando origem aos sintomas neuroglicopênicos. A hipoglicemia é uma condição que deve ser prontamente identificada e corrigida, pois é potencialmente fatal.
Hipoglicemias
O post de hoje será para responder à pergunta do Fernando Alves da UFV: “Qual o manejo correto do paciente com hiperglicemia e hipoglicemia no pronto socorro?”. O tema hiperglicemias será abordado na próxima atualização. A equipe do Widoctor agradece sua participação! Qualquer um que possua dúvidas ou sugestões de temas, entre em contato conosco!
Começaremos, então, com uma conceituação básica das hipoglicemias, com ênfase para sua abordagem nos pronto-atendimentos.
Essa condição, com exceção dos pacientes diabéticos, é uma condição incomum e deve ser suspeitada quando a glicemia for menor que 60 mg/dL (esse valor costuma variar dependendo da fonte). Na realidade, na ausência de sintomas, glicemias de até 50 mg/dL podem ser consideradas normais. Para realizamos o diagnóstico de hipoglicemia, é necessário que esteja presente os três critérios da tríade de Whipple. Observe o quadro abaixo.
Tríade de Whipple |
1. Hipoglicemia (glicemia < 60 mg/dL); 2. Sintomas de hipoglicemia; 3. Melhora dos sintomas após a administração de glicose. |
Valores de glicemia inferiores à cerca de 55 mg/dL produzem uma resposta fisiológica reflexa com a secreção de catecolaminas, surgindo então os chamados sintomas adrenérgicos, como palpitações, taquicardia, tremores, sudorese, fome e parestesias. Valores ainda mais baixos de glicemia irão comprometer as células nervosas (lembrem-se: os neurônios não utilizam ácidos graxos como fonte de energia, além de não possuírem estoques de glicogênio), dando origem aos sintomas neuroglicopênicos: cefaleia, sonolência, tonturas, ataxia, astenia, confusão, irritabilidade, déficits neurológicos focais, convulsões e coma. A hipoglicemia é uma condição que deve ser prontamente identificada e corrigida, pois é potencialmente fatal.
Atenção: pacientes com repetidos episódios hipoglicêmicos anteriores, com disfunção autonômica ou em uso de beta-bloqueadores podem não apresentar sintomas adrenérgicos, o que retarda o reconhecimento e o diagnóstico da hipoglicemia, aumentando o risco de sequelas neurológicas permanentes.
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A hipoglicemia geralmente ocorre pelo desequilíbrio entre a produção dos hormônios hipoglicemiantes (insulina) e dos hormônios hiperglicemiantes (glucagon, catecolaminas, GH e cortisol). Sua causa mais frequente é o diabetes mellitus, principalmente no caso de pacientes em terapia intensiva para o controle glicêmico. Dentre as causas de hipoglicemias pós-prandiais destacamos: esvaziamento gástrico acelerado, idiopática, ingestão alcoólica e galactosemia. Já os representantes das hipoglicemias de jejum são: uso de medicamentos (ex: insulina, álcool, sulfonilureia, meglitinidas, pentamidina, salicilatos), sepse, desnutrição grave, insuficiências hepática, renal e adrenal, insulinoma, factícia, autoimune, dentre outros.
Dentre as condições citadas, gostaria de chamar atenção para alguns pontos importantes. O álcool tem ação supressora da gliconeogênese, podendo causar hipoglicemias em casos de ingestão prolongada ou em pacientes desnutridos. A hipoglicemia factícia é mais comum em pacientes com doenças psiquiátricas, profissionais de saúde e em familiares de pacientes diabéticos; podemos suspeitar deste diagnóstico através de uma anamnese cuidadosa, da pesquisa sérica de sulfonilureias e da dosagem de peptídeo C (encontra-se suprimido se uso exógeno de insulina). O insulinoma é um tumor raro que costuma se manifestar com hipoglicemia e marcante aumento de peptídeo C.
Deve-se sempre pensar em hipoglicemia em todo paciente com alterações neurológicas no pronto-socorro (confusão, agressividade, convulsões, coma, etc.).
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Se estivermos diante de uma hipoglicemia pouco sintomática, oferecemos ao paciente algum alimento com açúcares de absorção rápida. O tratamento nos casos mais graves se faz pela infusão de 60 a 100 mL de glicose a 50% IV. Em pacientes sem acesso venoso, pode-se fazer o glucagon IM ou SC (1,0 a 2,0 mg), embora seu efeito seja fugaz. O glucagon, na realidade, é uma boa medicação de urgência para se ter em casas de pacientes diabéticos com risco de hipoglicemias graves. Em pacientes desnutridos, hepatopatas ou etilistas, a fim de prevenir a encefalopatia de Wernicke-Korsakoff, devemos prescrever também tiamina (100 mg, IV ou IM, juntamente com a glicose).
Em pacientes diabéticos em uso de insulina ou sulfonilureias, sem causa aparente de hipoglicemia, devemos sempre investigar insuficiência renal, podendo o quadro ser justificado por um aumento da meia vida da droga em decorrência de uma menor eliminação renal.
O quadro abaixo resume os principais passos da terapêutica.
TRATAMENTO DE HIPOGLICEMIA |
1. Realizar imediatamente uma glicemia capilar em qualquer doente com rebaixamento do nível de consciência ou déficit neurológico; 2. Acesso venoso imediato; 3. Colher uma bioquímica e glicemia; 4. Glicose a 50%: 60 a 100 mL IV; 5. Se não conseguir o acesso venoso, realizar glucagon (1 a 2 mg IM); 6. Se risco para desenvolver encefalopatia de Wernicke (desnutrição, alcoolismo), prescrever juntamente tiamina (100 mg IV ou IM). |
Igor Torturella
Referência
1) MARTINS, Herlon Saraiva et al. Emergências Clínicas: Abordagem Prática. Disciplina de emergências clínicas hospital das clínicas da FMUSP. Editora Manole. 8ᵃ edição.