A tuberculose (TB) continua a ser uma doença rara nos Estados Unidos, mas, quando ocorre, os atrasos no diagnóstico geralmente excedem as recomendações da Organização Mundial de Saúde, de acordo com um novo relatório de pesquisadores da Harvard Medical School publicado no The Lancet Infectious Diseases.
O atraso típico, ou mediano, no diagnóstico de um caso ativo de TB foi de 24 dias, de acordo com o estudo, com a maioria dos atrasos variando entre 10 e 45 dias. No entanto, alguns atrasos eram muito maiores – até 250 dias em certos casos.
Ao contrário da TB latente, em que a pessoa que carrega a bactéria da TB não apresenta sintomas e não pode infectar outras pessoas, as pessoas com TB ativa apresentam sintomas e podem transmitir a infecção a outras pessoas.
A nova análise revelou que os diagnósticos tardios estavam associados a uma maior probabilidade de transmissão da infecção aos membros da família. Também foi encontrada uma ligação preocupante entre atrasos no diagnóstico e o risco de progressão da doença.
Para minimizar as complicações da TB e prevenir a transmissão da infecção, a OMS pede o início da investigação diagnóstica e do tratamento imediato para todos os pacientes que apresentam sintomas sugestivos de infecção por TB ativa por duas semanas ou mais.
“Os atrasos que encontramos seriam preocupantes em qualquer circunstância, mas são inaceitáveis em um sistema de saúde com bons recursos, como os Estados Unidos”, disse a pesquisadora sênior do estudo Maha Farhat, professora assistente de informática biomédica no Blavatnik Institute da Harvard Medical School e médica de medicina pulmonar no Massachusetts General Hospital.
Embora o novo estudo não tenha sido desenhado para descobrir as razões por trás dos atrasos no diagnóstico, os pesquisadores dizem que um dos fatores mais prováveis é a falta de conscientização entre os médicos, possivelmente devido à raridade da tuberculose nos Estados Unidos. A apresentação clássica da TB inclui tosse com sangue, febre e suores noturnos, mas a TB também pode se apresentar com uma variedade de sintomas que não se enquadram nesta tríade de livro didático e pode confundir os médicos, tornando o diagnóstico imediato um desafio.
Na verdade, a análise sugere que alguns dos atrasos poderiam ser evitados, ou pelo menos minimizados, ressaltando a importância de aumentar a conscientização do médico. Por exemplo, o uso de imagens do tórax e testes de diagnóstico molecular pressagiava um tempo menor para o diagnóstico e tratamento, assim como receber cuidados de um especialista em doença infecciosa ou medicina pulmonar.
“Nossas descobertas apontam para a importância fundamental da educação continuada dos médicos. Encontramos vários fatores associados a atrasos e a diagnósticos mais rápidos”, disse Farhat. “Isso nos diz que atrasos são modificáveis e evitáveis”.
O estudo aponta que um alto índice de suspeita é necessário para iniciar o teste apropriado para tuberculose devido a seus sintomas multifacetados, embora os profissionais de saúde em ambientes de baixa incidência estejam se tornando menos familiarizados com a doença à medida que as taxas diminuem. Assim, o objetivo do estudo foi estimar os atrasos no diagnóstico e tratamento da tuberculose em nível nacional nos EUA entre 2008 e 2016.
Neste estudo de coorte observacional retrospectivo, reaproveitou-se os dados de sinistros de seguros de saúde privados fornecidos pela Aetna (Connecticut, EUA), para medir os atrasos no atendimento à saúde no diagnóstico de tuberculose nos EUA em 2008–16.
A tuberculose ativa foi determinada por códigos de diagnóstico e preenchimento de prescrições de tratamento antituberculose. Atrasos no atendimento à saúde foram definidos como a duração entre a primeira consulta ao atendimento de saúde por um sintoma de tuberculose e o início do tratamento antituberculose. Avaliou-se se os atrasos variaram ao longo do tempo, e por paciente e variáveis do sistema, usando regressão multivariável. Estimou-se a transmissão domiciliar da tuberculose e as complicações respiratórias após o início do tratamento.
Foram confirmados 738 casos de tuberculose ativa (incidência de 1,45 por 100.000 pessoas-ano) com um atraso médio do atendimento de saúde de 24 dias (IQR 10-45).
A análise de regressão multivariável mostrou que atrasos mais longos foram associados à idade avançada (8,4% por aumento de 10 anos [IC 95% 4,0 a 13,1]; p <0,086) e imunossupressão não relacionada ao HIV (19,2% [15,1 a 60,0]; p = 0,0432).
A apresentação de três ou mais sintomas foi associada a um atraso mais curto (-22,5% [-39,1 a -2,0]; p = 0,0415), em relação à apresentação de um sintoma, assim como o uso de imagens do tórax (-24,9% [-37,9 a -8,9]; p <0,098), testes de amplificação de ácido nucleico da tuberculose (-19,2% [-32,7 a -3,1]; p = 0,0241), e atendimento por um médico especialista em tuberculose (-17,2% [-33,1 a -22,3]; p <0,0087).
Atrasos mais longos foram associados a um aumento da taxa de complicações respiratórias, mesmo após o controle das características do paciente, e a um aumento da taxa de tuberculose secundária entre os dependentes.
O estudo concluiu que, nos EUA, o atraso médio no atendimento de saúde para pacientes com seguro de saúde privado com tuberculose excede os níveis recomendados pela OMS de 21 dias (3 semanas). Os resultados sugerem a necessidade de educação dos profissionais de saúde sobre as melhores práticas no diagnóstico da tuberculose, incluindo o uso de testes moleculares e a manutenção de um alto índice de suspeita para a doença.
Original: https://www.news.med.br/p/medical-journal/1391870/estudo+mostra+atrasos+preocupantes+no+diagnostico+de+tuberculose+nos+estados+unidos+o+que+pode+contribuir+para+maior+probabilidade+de+transmissao+da+infeccao.htm