Este é o primeiro de uma série de artigos do WiDoctor destinados a grandes temas da Psiquiatria, cujo conhecimento é importante para todos os médicos, independente da especialidade.
Hoje falaremos sobre as alterações quantitativas e qualitativas da consciência, como o delirium, o transe e a experiência de quase morte.
Boa leitura!
Manual Básico de Psiquiatria
Psicopatologia 1: Alterações da Consciência
A semiologia psicopatológica cuida do estudo dos sinais e sintomas produzidos pelos transtornos mentais.
Consciência é definida como o estado de vigília e capacidade de entrar em contato com a realidade, perceber e conhecer os objetos.
Alterações normais da consciência: sono e sonhos.
Alterações Patológicas da Consciência
Alterações Quantitativas (relacionadas ao nível da consciência):
– Obnubilação ou turvação da consciência: rebaixamento em grau leve a moderado. Dificuldade para integrar as informações sensoriais do ambiente; alguma sonolência; dificuldade de compreensão.
– Torpor: o paciente só pode ser despertado por um estímulo enérgico e/ou doloroso; evidente sonolência; incapaz de ações espontâneas.
– Coma: impossibilidade de ações voluntárias conscientes; ausência de qualquer indício de consciência; sinais neurológicos podem estar presentes: nistagmo, anormalidades do olhar conjugado, anormalidade dos reflexos oculocefálicos (cabeça de boneca); rigidez de decorticação (flexão dos membros superiores ao estímulo doloroso) ou descerebração (extensão dos membros ao estímulo).
Síndromes psicopatológicas associadas ao rebaixamento do nível de consciência
Delirium: síndrome confusional aguda, devido a distúrbio cerebral agudo; rebaixamento leve a moderado do nível de consciência; desorientação; ansiedade em graus variáveis; discurso ilógico e confuso. O quadro oscila ao longo do dia, normalmente com piora à tarde e à noite. Não confundir com delírio (alteração do juízo de realidade).
Alterações Qualitativas da consciência
De modo geral, são acompanhadas por algum grau de rebaixamento do nível da cosnciência.
1 – Estado crepuscular: estado transitório, pode surgir e desaparecer de forma abrupta e ter duração variável, de poucos minutos ou horas a algumas semanas. Frequentemente associado a causas orgânicas (confusão pós-ictal, intoxicações, traumatismo craniano). Consciência restringida a um círculo de idéias de importância particular par o sujeito, com conservação de atividade psicomotora global mais ou menos coordenada, permitindo atos automáticos – frequentemente violentos e com descontrole emocional. Geralmente ocorre amnésia lacunar para todo o episódio.
2 – Estado segundo: semelhante ao estado crepuscular, mas a atividade psicomotora é estranha à personalidade do sujeito. Atos extravagantes, em contradição com a educação e conduta habitual do paciente, mas quase nunca graves e violentos. Mais frequentemente provocada por choques emocionais intensos.
3 – Dissociação da consciência: fragmentação do campo da consciência, geralmente desencadeada eventos psicologicamente significativos geradores de grande ansiedade. As crises duram de minutos a horas, raramente permanecendo por dias. Ocorre com cerra freqüência nos quadros histéricos (crises histéricas do tipo dissociativo), quando pode ser vista como uma estratégia defensiva inconsciente: o indivíduo se desliga da realidade para não sofrer.
4 – Transe: se assemelha a sonhar acordado, mas com atividade motora automática e estereotipada, acompanhada de suspensão parcial dos movimentos voluntários. Ocorre em contextos religiosos e culturais. Não confundir o transe religioso, culturalmente contextualizado e sancionado, com o transe histérico, que é um estado dissociativo da consciência frequentemente relacionado a conflitos interpessoais e alterações psicopatológicas.
5 – Estado hipnótico: consciência reduzida e estreitada e de atenção concentrada, que pode ser induzido por outra pessoa (hipnotizador). A sugestionabilidade do indivíduo encontra-se aumentada, e sua atenção concentrada no hipnotizador. Nesse estado, podem ser lembradas cenas e fatos esquecidos e podem ser induzidos fenômenos como anestesia, paralisias, rigidez muscular e alterações vasomotoras.
6 – Experiência de quase-morte (EQM): estado especial de consciência verificado em situações críticas de ameaça grave à vida, como parada cardíaca, hipóxia grave, isquemias, acidentes automobilísticos, entre outros. Normalmente descritas como sensações de paz, de estar fora do próprio corpo, de sentir-se rodeado por uma luz intensa, contato com entidades místicas e sensação de alegria intensa. Tentativas de explicar a EQM envolvem a atividade maciça de sono REM durante o episódio, além de hipóteses socioculturais e históricas.
Na próxima parte do Manual Básico de Psiquiatria, vamos falar da capacidade de Atenção e das suas alterações. Até lá!
Adaptado de: Dalgalarrolo, Paulo. Psicopatologia dos transtornos mentais. 2ed. Porto Alegre: Artmed, 2008.
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