“A ostra, para fazer uma pérola, precisa ter dentro de si um grão de areia que a faça sofrer. Sofrendo, a ostra diz para si mesma: ‘preciso envolver essa areia pontuda que me machuca com uma esfera lisa que lhe tire as pontas’. Ostras felizes não fazem pérolas. Pessoas felizes não sentem a necessidade de criar. O ato criador, seja na ciência ou na arte, surge sempre de uma dor. Não é preciso ser uma dor doída… Por vezes a dor aparece como aquela coceira que tem o nome de curiosidade. Para me livrar da dor, escrevi“. – Rubem Alves
A mente humana evoluiu a um ponto em que, muitas vezes, podemos ter a prepotência de acreditar que poucas coisas são impossíveis de serem realizadas por nós. Ao mesmo tempo, temos uma facilidade surpreendente em enxergar o lado negativo das situações, em detrimento de tantos eventos positivos que nos são proporcionados o tempo todo. Será que estamos utilizando nossa capacidade mental e cognitiva para avançar em produzir um ambiente mais equilibrado, lutar de maneira inteligente e, mesmo com as adversidades, ter grandes conquistas? Ou estamos desperdiçando esse privilégio evolutivo porque parece mais cômodo simplesmente reclamar do que nos deixa insatisfeitos?
Ao longo da vida, aprendemos que existem etapas, ciclos, momentos bons e ruins. Assim, adversidades são inevitáveis. O importante ponto aqui é como lidamos com essas adversidades, como absorvemos delas aprendizado para crescer. Podemos manter a calma e agir de acordo com as possibilidades para resolver os contratempos, ou podemos nos desesperar, perder a capacidade de analisar racionalmente os fatos e não resolver nada.
A obra de Nassim Nicholas Taleb, “O antifrágil”, trata desse tema com maestria. Segundo o autor, o conceito de antifragilidade define aquilo que se beneficia com o choque, que prospera e cresce quando exposto à volatilidade, à desordem e a fatores estressantes. Portanto, ser antifrágil é um passo além da resiliência. Nesta, o objeto volta ao estado original após cessar o fator estressante. Já na antifragilidade o objeto é aprimorado pela pressão e pelo estresse. Essa característica é cada vez mais relevante diante do contexto atual, de crescimento de competitividade, de busca por eficiência e, como se já não fosse o suficiente, de atravessar uma pandemia.
Nesse conceito de Taleb, ainda que seja muito mais fácil ao ser humano reclamar, o que coopera de maneira significativa para ser antifrágil é a prática da gratidão. Em certa palestra, a escritora Marcia Luz recomendou que tivéssemos um elástico no pulso e, toda vez que reclamássemos, trocássemos de pulso o elástico. Qualquer um que faça esse experimento ficará estarrecido ao perceber quantas vezes reclamamos por dia. Ao mesmo tempo, é difícil lembrar a última vez em que agradecemos por algo positivo que nos tenha ocorrido. E aqui discorremos sobre as coisas simples do dia a dia. Quantas vezes você foi grato pela comida no prato, pela roupa que veste, pelo apoio e carinho da família, pelos amigos, pelo teto que te protege? Devemos enfrentar os dissabores com positividade, coragem e gratidão.
Assim como as adversidades são inevitáveis, os momentos bons chegarão e deverão ser aproveitados. Ainda assim, não devemos esquecer que oportunidades de crescimento, em geral, são acompanhadas de desconforto, de tribulações. Da mesma forma, há de se ter em mente que quanto maior o desafio, maior a vitória, e também que praticar a gratidão ajuda a atravessar com mais resistência os momentos desfavoráveis. Nesse raciocínio, assim como a ostra, que traz à existência uma pérola através do incômodo e da dor, devemos ser antifrágeis e utilizar as tempestades para nos tornarmos fortes e produzirmos frutos notáveis.