Conceito e classificação
As primeiras quinolonas foram utilizadas no início dos anos 60, com a introdução do ácido nalidíxico na prática clínica. No início dos anos 80, com o acréscimo de um átomo de flúor na posição 6 do anel quinolônico, surgiram as fluorquinolonas (principal representante: ciprofloxacina), com aumento do espectro, para os bacilos gram-negativos e boa atividade contra alguns cocos gram-positivos, porém, pouca ou nenhuma ação sobre Streptococcus spp., Enterococus spp. e anaeróbios.
Mecanismo de ação
Inibem a atividade da DNA girase ou topoisomerase II, enzima essencial à sobrevivência bacteriana. A DNA girase torna a molécula de DNA compacta e biologicamente ativa. Ao inibir essa enzima, a molécula de DNA passa a ocupar grande espaço no interior da bactéria e suas extremidades livres determinam síntese descontrolada de RNA mensageiro e de proteínas, determinando a morte das bactérias. Também inibem, in vitro, a topoisomerase IV, porém não é conhecido se este fato contribui para a ação antibacteriana.
Mecanismos de resistência
A resistência ocorre, principalmente, por alteração na enzima DNA girase, que passa a não sofrer ação do antimicrobiano. Pode ocorrer por mutação cromossômica nos genes que são responsáveis pelas enzimas alvo (DNA girase e topoisomerase IV) ou por alteração da permeabilidade à droga pela membrana celular bacteriana (porinas). É possível a existência de um mecanismo que aumente a retirada da droga do interior da célula (bomba de efluxo).
Propriedades farmacológicas
São bem absorvidas pelo trato gastrintestinal superior. A biodisponibilidade é superior a 50% e o pico sérico é atingido em 1 a 3 horas após a administração. Os alimentos não reduzem substancialmente a absorção, mas retardam o pico da concentração sérica. A ligação protéica está normalmente entre 15 e 30%.
O volume de distribuição geralmente é alto. As concentrações na próstata, fezes, bile, pulmão, neutrófilos e macrófagos excedem as concentrações séricas. Já as concentrações na saliva, ossos, e líquido cérebro espinhal são menores que as plasmáticas.
As novas quinolonas como a levofloxacina, atingem altas concentrações séricas, concentração máxima de 4mg/L, após 500mg por via oral. A área sob a curva é elevada. Possui meia-vida de 7 a 8 horas, podendo ser administrada tanto por via endovenosa, como oral, uma única vez ao dia. A ligação protéica é de 20 a 30%, sendo a eliminação predominantemente renal, 80 a 90%.
Indicações clínicas
A seguir serão descritas as principais indicações clínicas das quinolonas.
A. Trato genito-urinário
B. Trato gastrintestinal
C. Trato respiratório
D. Osteomielites
E. Partes moles
F. Ação contra micobactérias
A. Trato genito-urinário
O ácido nalidíxico é indicado, exclusivamente, para o tratamento de infecções baixas do trato urinário. Para infecções urinárias não complicadas, como cistites em mulheres jovens, causadas por germes altamente sensíveis, as quinolonas são altamente efetivas. As fluorquinolonas podem ser utilizadas em pielonefrites complicadas. Pela alta concentração que atingem na próstata e pela sua atividade contra os microrganismos mais freqüentemente causadores de prostatites, são uma excelente indicação para estas infecções. As quinolonas são ativas contra bactérias do trato genital como Chlamydea trachomatis e Mycoplasma hominis, que podem causar uretrite inespecífica. Por outro lado, não apresentam boa atividade contra o Treponema pallidum. No tratamento de doença inflamatória pélvica, onde geralmente existe associação de gonococos, clamídeas, germes entéricos e anaeróbios a associação de uma quinolona com um agente com ação anaerobicida é recomendada.
B. Trato gastrintestinal
Todos os patógenos bacterianos conhecidos como causadores de gastroenterites são suscetíveis às quinolonas, inclusive as salmoneloses, pela alta concentração destes agentes nas fezes: diarréia do viajante, shigelose, infeções causadas por C. jejuni.
C. Trato respiratório
Para infecções de vias aéreas superiores como sinusites, onde a ciprofloxacina não é indicada, as novas quinolonas (levofloxacina, moxifloxacina e gemifloxacina), por sua ação contra cocos gram-positivos, principalmente pneumococos, são uma alternativa terapêutica, principalmente nas sinusites de repetição. Podem ser utilizadas no tratamento da exacerbação aguda das bronquites crônicas onde predominam os bacilos gram-negativos. Nos casos de pneumonia adquirida na comunidade as novas quinolonas, devido ao seu espectro de ação contra pneumococos, mostram-se mais efetivas. As novas quinolonas são muito úteis no tratamento de pneumonias atípicas como as causadas por Legionella spp. e Mycoplasma spp. e C. pneumoniae, cuja resposta clínica é semelhante aos macrolídeos. Bons resultados também têm sido obtidos em infecções pulmonares associadas à assistência à saúde, com o uso das fluorquinolonas, dependendo, obviamente, do perfil de resistência da microbiota bacteriana. Podem ser utilizadas, ainda, no tratamento da exacerbação de infecção respiratória, leve ou moderada, de pacientes com fibrose cística, onde a P. aeruginosa é o agente prevalente.
D. Osteomielites
Nas osteomielites, sobretudo nas crônicas, onde existe a necessidade de tempo prolongado de tratamento, as quinolonas são uma ótima opção, não só pela possibilidade do uso oral, mas pelo espectro de ação.
E. Partes moles
Outra indicação terapêutica das quinolonas refere-se às infecções de pele e de tecido celular subcutâneo complicadas, como é o caso de escaras infectadas, úlceras crônicas e infecções em pacientes diabéticos (pé-diabético). A associação de agente com ação sobre anaeróbios deve sempre ser considerada. Para as infecções de pele e de tecido celular subcutâneo não complicadas, as novas quinolonas podem ser uma alternativa. Já as fluorquinolonas, pelo espectro de ação restrito para os gram-positivos, não devem ser empregadas de rotina.
F. Ação contra micobactérias
As quinolonas também apresentam boa atividade contra micobactérias, especialmente a ciprofoxacina, ofloxacina e levofloxacina. São ativas contra M. tuberculosis, M. fortuitum, M. kansasii, entretanto, apresentam pouca atividade contra M. avium-intracellulare. Entretanto, deve ser ressaltado que as quinolonas são menos efetivas que os agentes anti-tuberculostáticos de primeira linha.
Efeitos colaterais
São drogas relativamente seguras e os efeitos colaterais mais comuns envolvem:
- o trato gastrintestinal e ocorrem em 3 a 17% dos casos. Os mais freqüentes são: anorexia, náuseas, vômitos e desconforto abdominal. Diarréia é pouco freqüente e a colite associada a antimicrobiano raramente é relatada.
- o sistema nervoso central (ocorrem em 0.9 a 11% dos casos). Mais freqüentemente cefaléia, tontura, insônia e alterações do humor. Alucinações, delírios e convulsões são raras. Maior atenção com estes efeitos deve ser dada para pacientes idosos. As convulsões estão associadas ao uso concomitante de quinolonas e teofilinas ou anti-inflamatórios não hormonais.
- alergias e reações cutâneas (em 0.4 a 2.2% dos casos). Sendo o rash cutâneo o mais comum. Fototoxicidade pode ocorrer com exposição à luz ultravioleta.
- febre relacionada à droga, urticária, angioedema, reações anafiláticas e vasculite são incomuns. Nefrite intersticial, associada à eosinofilúria e cristalúria também é rara.
- artropatias e erosões de cartilagem ocorrem em animais jovens, sobretudo com o uso prolongado e em altas doses, limitando o uso destas drogas em crianças. Entretanto, o uso desta classe de drogas em situações especiais em crianças como na fibrose cística tem aumentado. Nestes casos, somente artralgia reversível em 2% dos casos foi observada.
- leucopenia e eosinofilia ocorrem em menos de 1% dos casos, assim como elevação dos níveis de transaminases que ocorre em 1 a 3% dos pacientes que recebem quinolonas. Raramente a terapia é interrompida devido a estas alterações.