Introdução
Embora seja uma área pouco conhecida, divulgada e até pouco trabalhada no Brasil, a Psiquiatria do Esporte e do Exercício já é uma realidade em países como os EUA e na Europa. Não apenas atletas individualmente já buscam um psiquiatra do esporte, mas equipes da NFL (futebol americano) e MBL (beisebol), além de alguns clubes de futebol europeus já contam com psiquiatras especializados para cuidar dos seus atletas, gestores, comissões técnicas e também familiares.
Com o objetivo de impulsionar o desenvolvimento da especialidade, foi criada, em 1994, a Sociedade Internacional de Psiquiatria do Esporte (acesse o site da Sociedade clicando aqui!). Nela, estão reunidos psiquiatras peritos em questões esportivas e que aspiram trabalhar com atletas nos mais diferentes níveis competitivos ao redor do mundo. Essa iniciativa tem contribuído para a melhor definição de estratégias comportamentais e farmacológicas (desde patologias mentais ativas, sub-síndromes, normalidade, até a otimização da performance), bem como o estabelecimento de diretrizes sólidas baseadas em evidências, sempre com o objetivo de proporcionar ao atleta, seus familiares e membros de agremiações esportivas a melhor qualidade de vida e desempenho máximo profissional.
Algumas competências essenciais do Psiquiatra do Esporte:
1) Preparação mental e treinamento das habilidades mentais
2) Controle do estresse esportivo e prover melhor qualidade de vida
3) Regulação dos níveis energéticos diários e da qualidade do sono
4) Controle da dor e manejo de lesões (ativas e após o retorno aos jogos)
5) Atenção ao uso e abuso de substâncias (lícitas e ilícitas) e risco de doping
6) Perícia no tratamento dos transtornos mentais relacionados ao esporte
7) Experiência e metodologia para trabalhos com agremiações esportivas
8) Competências relacionadas à idade, sexo, cultura e fase de desenvolvimento dos atletas
9) Conhecimento amplo relacionado à internet/redes sociais e seu impacto sobre o esportista
10) Multiprofissionalismo e interdisciplinaridade eficiente (p. ex. articulação com médicos do esporte, psicólogos, preparadores físicos, dirigentes)
Mas e a Psicologia esportiva? Não é a mesma coisa?
Embora os psicólogos do esporte sejam profissionais extremamente importantes e indispensáveis pelo acompanhamento psicológico provido a curto e longo prazo aos esportistas, eles possuem abordagens e métodos distintos dos psiquiatras, dada sua própria formação. O Psiquiatra do Esporte provê o cuidado médico especializado em saúde mental para os atletas. São duas áreas de atuação que visam assistência em saúde mental, porém com metodologias singulares de cada uma. A psicologia e a psiquiatria do esporte têm muito a somar para o esporte e também entre si mesmas em uma “troca” de experiências. Principalmente considerando o trabalho interdisciplinar.
Uma vez que existem tantas ferramentas e tecnologias voltadas para a fisiologia do exercício (parte física), por que não provermos tudo o que temos à disposição dos aspectos mentais/psíquicos, disponibilizando os profissionais responsáveis por esses cuidados?
Devido a inúmeros fatores, como: o próprio estigma da população em relação à psiquiatria, a crença de que todo medicamento prescrito pelo psiquiatra trará prejuízos no desempenho ou que serão enquadrados como doping, e o próprio sentimento do atleta em relação a si mesmo entendendo como sinal de fraqueza procurar o psiquiatra, ainda trata-se de uma especialidade vista como intervencionista, apenas para momentos de crise extrema.
Assim, como fundamentado pela própria psicóloga esportiva do Comitê Olímpico Brasileiro, Aline Wolff, em sua participação na primeira Mesa Redonda de Psiquiatria do Esporte e do Exercício* no XXXV Congresso Brasileiro de Psiquiatria (realizado em outubro de 2017 em São Paulo/SP), a área desportiva clama pela parceria entre psicólogos e psiquiatras especializados em questões esportivas desde a prevenção, e não para “tapar buracos” quando eventual problema já se encontra instaurado.
Por fim, existe um modelo de atuação específico em Psiquiatria do Esporte?
Por se tratar de um campo pouco explorado e em desenvolvimento, a Psiquiatria do Esporte carece de grandes estudos. De tal maneira, cada psiquiatra terá sua metodologia de trabalho, uma vez que ainda não temos nenhuma diretriz específica estabelecida para atuação em Psiquiatria do Esporte.
Ainda assim, dentro da individualidade laborativa de cada profissional, é essencial utilizar métodos eficazes envolvendo a psiquiatria baseada em evidências científicas.
As grandes perspectivas de atuação na área permitem um leque diversificado de atuações para o Psiquiatra do Esporte. Seja lidando com questões alimentares ligadas ao esporte, promoção de saúde mental ligada à prática esportiva, compondo um Departamento Médico de agremiação esportiva, provendo consultorias coletivas, assistindo atletas de alto rendimento ou amadores individualmente, pesquisando neurociência ligada ao esporte…
O importante é nos conscientizarmos da pertinência de um cuidado mais amplo ligando a saúde mental ao contexto esportivo. Além disso, buscarmos contribuir para o desenvolvimento da especialidade – por meio de pesquisas e estudos.
Essa contribuição deve começar tão cedo no meio acadêmico entre os universitários, nas residências médicas, centros de pesquisa e nos próprios departamentos médicos de agremiações esportivas que buscam otimizar seus cuidados.
*Relatores que compuseram a Mesa Redonda 40 no XXXV CBP:
– Helio Fádel (psiquiatra e membro da Sociedade Internacional de Psiquiatria do Esporte)
– Aline Wolff (psicóloga esportiva do Comitê Olímpico Brasileiro)
– Marcelo Migon (psiquiatra e mestre em saúde coletiva)
– Fernando Solera (ortopedista e médico-chefe da Comissão Antidopagem da CBF)
Dr. Helio Fádel
Psiquiatra Clínico e do Esporte
TEXTO RETIRADO DO SITE: http://heliofadel.com.br/o-que-e-a-psiquiatria-do-esporte/